Passei a manhã adiantando meu trabalho porque a tarde de quinta-feira seria só minha e dela. Equipei minha bolsa com celular, um livro que estou buscando referências para um trabalho, roupa extra para Valentina, garrafa de água e barras de cereais.
A ideia era ir até um centro comercial que fica a uns 30 minutos da nossa casa, lá almoçaríamos, cortaríamos os cabelos, eu e ela, compraríamos um presente para minha sobrinha, que fará 15 anos e está fazendo intercâmbio em Londres, e passaríamos 2 horas em um Parque de Diversões dentro desse shopping, enquanto ela brinca nas piscinas de bolinhas eu costumo trabalhar.
Os planos eram maravilhosos, fui buscá-la na escola e não a vi na sala, sempre que chego ela já vem correndo me abraçar. A professora falou que ela estava lavando as mãos, também não a encontrei no banheiro, quando voltei ela estava em um canto da sala com 2 amiguinhos, eu não a tinha visto. Valentina fazia com um dos amiguinhos uma barreira com um colchãozinho e o outro, que era menor do que ela, puxou o colchão, para minha surpresa ela levantou a mão e bateu nele.
Eu vi a cena estupefata, minha filha é uma criança doce, comunicativa, faz amizade como quem troca de roupas, nunca a vi bater em ninguém. Imediatamente ela me viu, ficou tão nervosa que não saia do lugar, sou daquelas mães que não precisam falar nada, ela vê minha sobrancelha subindo e minha cara de reprovação se formando em 2 segundos.
Ela veio até mim e começou a falar nervosa: – “Mamãe te amo”. Ela sabe que palavras doces podem apaziguar situações, mas também já aprendeu que na nossa casa palavras tem menos valor que as ações. Eu me abaixei até ela e perguntei: – Por que você bateu no amiguinho Valentina? Volte lá e peça desculpas. Ela não quis ir e começou a apertar minhas mãos, quando está irritada ela faz isso.
Eu falei que conversaríamos depois. Saímos e perguntei por que que ela fez aquilo, ela continuava contrariada apertando minhas mãos.
“Ok Valentina então vamos cancelar o passeio no Parque, parece que você não se comportou bem hoje.”
Ela começou a chorar, o caminho foi de chantagem emocional, manhas e nenhuma explicação do porquê bater no amiguinho. Mantive a calma, nomeei os sentimentos que provavelmente ela estava sentindo, como raiva e frustração para que ela entendesse…. ela continuou o drama que variava entre choro e um som que mais parece com rosnado de cachorro.
Voltamos para casa, essa hora ela percebeu que era sério, não íamos mesmo no Parque, entrou chorando mas só nesse momento senti que ela estava realmente triste e “sentida”. Eu queria sumir a ter que ver aquelas “lagriminhas” caindo da minha “cachinhos dourados”. Meu coração já estraçalhado gritava: Leva a menina no Parque, ela vai pedir desculpas, leva mãe, leva mãe. Minha cabeça dizia: Não leva não, amar é educar.
Entramos em casa e expliquei que não fomos no Parque pelo que aconteceu, que eu gostaria de entender porque ela bateu no amiguinho que parecia não ter feito nada. Ela me contou como se sentiu quando o amiguinho puxou o colchão, reconheceu estar errada, me pediu desculpas e me abraçou, expliquei o quão rude e feio é bater num amiguinho, ela disse que amanhã quando chegar na escola vai pedir desculpas.
Educar é um dos maiores desafios que um ser humano pode ter, suprir o outro de ferramentas internas para que ele cresça forte, que seja uma pessoa justa e correta, é duro, há-de se abrir mão de muitas coisas e estar muito envolvido. Ter filho qualquer um pode ter, criar com presença e exemplos é que não é nada fácil. Li uma frase outro dia, não sei de quem é mas dizia: “Para ensinar você não precisa TER, mas precisa SER”, há uma complexidade imensa nessas poucas palavras, porque para SER você também precisa ter sido suprido de recursos internos, e infelizmente nem todos são. Às vezes a pessoa precisa procurar na vida, ou em si próprio, aquilo que não recebeu em sua família de origem.
Por aqui a gente tem muito mais perguntas do que respostas, tentamos trabalhar o tempo todo com a intuição, não existe fórmula para educar, mas existe uma vontade imensa e disposição para acertar. Estou frustrada por ter perdido a tarde de passeios com a Valentina, mas entre uma tarde feliz e divertida com ela e a oportunidade de ensinar-lhe que tudo o que fazemos na vida, de bom e de ruim, tem consequencias, escolhi a segunda opção.
Espero não estar errada, espero como mãe fazer jus a dádiva que é ter recebido essa filha. Espero que outros papais e mamães, às vezes tão inseguros como eu fico de vez em quando, consigam tomar as melhores atitudes, dar os melhores exemplos.
Ela come um lanchinho, e eu preparei um café duplo para mim, bem forte e amargo, para dar um tranco nessa tarde que era para ser de um jeito, e terminou de outro. Nada que a gente não possa recuperar num outro dia, o que vale a pena é não perder a lição.
A vida voa como foguete e a cada dia que passa me vejo mais aprendiz.
Sejamos felizes!